O mundo está ficando surdo
Que o mundo lá fora anda mais barulhento, não resta dúvida, e o excesso de ruído pode ser ainda maior para as novas gerações, que não vivem sem aparelhos sonoros em casa, no carro ou direto no ouvido (tocadores de MP3 ou iPods). No Canadá, mais de um milhão de pessoas têm problema de audição, e a superexposição ao barulho é responsável por 33,7% dos casos. No Brasil, de acordo com o IBGE, 5,7 milhões de pessoas têm algum grau de insuficiência auditiva.Além disso, um estudo sobre conservação auditiva realizado em 2000, com mil estudantes entre 17 e 23 anos de uma universidade em São Paulo, revelou alterações da audição em 20,5% dos exames audiométricos.
Quando ouvimos bem, o ouvido externo capta a onda sonora e a “afunila” para dentro do canal auditivo até o tímpano, no ouvido médio. O tímpano vibra; o som é amplificado e transmitido para a cóclea, ou ouvido interno. Neste tubo cheio de líquido, milhares de pequeninas células ciliadas flexionam-se e dobram-se em resposta às vibrações. Elas geram impulsos elétricos que se propagam pelo nervo auditivo até o cérebro, que então as transforma em informação sonora. Qualquer imprevisto ao longo do caminho pode causar problemas.
Se o som não consegue atravessar o ouvido médio, você tem a chamada perda auditiva condutiva. Ela pode ser causada por grande variedade de doenças e condições, como acúmulo de cera ou infecção bacteriana, e não costuma durar muito. Os tratamentos em geral são bem-sucedidos e só ocasionalmente uma cicatriz causa dano permanente.No entanto, a lesão do ouvido interno, ou perda auditiva neurossensorial, tem mais probabilidade de ser irreversível.
O Dr. Antônio Lobo, professor de Otorrinolaringologia da Universidade Federal de Minas Gerais, explica que as células ciliadas do ouvido interno formam a estrutura nobre do aparelho auditivo. Se forem lesionadas, haverá prejuízo na percepção das freqüências sonoras na região atingida do ouvido interno. No caso de trauma acústico, por exemplo, a lesão ocorre principalmente na região onde estão as células responsáveis pela percepção de sons agudos. Nesse caso, há perda na capacidade de se discriminarem palavras ou sílabas que apresentem maior concentração de agudos.
Segundo o Dr. Luiz Carlos Alves de Sousa, presidente da Sociedade Brasileira de Otologia e coordenador da Campanha Nacional de Audição, “de todas as causas que levam à surdez, a exposição ao barulho é uma das poucas que podemos evitar. O problema é que a lesão auditiva não acontece da noite para o dia: é cumulativa. Uma hora usando um iPod acima de 100 decibéis hoje, somada a outras, pode, com o tempo, dificultar a compreensão durante a conversa”. Enquanto muitos trabalhadores usam protetores auriculares, as pessoas em geral não se preocupam com o barulho durante o lazer.
Para preservar a audição, é preciso estar atento à altura do som que ouvimos e ao tempo que ele dura. Qualquer tipo de ruído – um rock, uma sinfonia ou o barulho de uma máquina – pode causar problemas. A gravidade do dano depende da combinação entre tempo de exposição, intensidade (altura) e a suscetibilidade de cada pessoa. “Às vezes, há vários aparelhos ligados em casa, como máquina de lavar, microondas e computador, e os ruídos vão se somando sem que percebamos. É importante ficar alguns minutos em silêncio para dar descanso às células ciliadas”, aconselha a Dra. Eliane Schochat, presidente da Academia Brasileira de Audiologia.